Milicianos pagavam propina para atrasar investigação sobre morte de Marielle Franco
A Polícia
Federal (PF) encontrou provas de que
houve atos de corrupção praticados por membros da DH (Delegacia de Homicídios
da Capital) que impediram o esclarecimento da autoria de assassinatos que
envolvem milicianos do "Escritório do Crime" e integrantes da máfia
do jogo do bicho no Rio de Janeiro.
A informação foi
confirmada ao portal UOL por duas fontes ligadas ao inquérito da PF que apura
se houve obstrução à investigação sobre a morte da vereadora Marielle Franco
(PSOL) e do motorista Anderson Gomes
- crime ocorrido em 14 de março de 2018. A reportagem apurou que ao menos dois
delegados estariam na folha de pagamento do "Escritório do Crime". A
propina era paga na própria sede da DH, localizada na Barra da Tijuca (zona
oeste do Rio). Após a conclusão do Caso
Marielle, os policiais federais vão focar no desbaratamento da relação
promíscua que une integrantes do crime organizado e agentes da segurança
pública do estado.
Pelo menos oito inquéritos da DH estão sob análise da PF por
determinação da PGR (Procuradoria-Geral da República). Além do caso Marielle,
também estão submetidas à varredura federal as investigações sobre as execuções
de dois herdeiros de clãs da máfia do jogo do bicho: Hayton Escafura e Myro
Garcia, assassinados em 2017. Esses e outros crimes são atribuídos à milícia
conhecida como "Escritório do Crime".
Durante sua investigação,
a PF analisou se o grupo criminoso contava com infiltrados dentro da DH,
conforme depoimentos de dois delatores ouvidos por procuradores da República.
Procurada por email para comentar a investigação da PF, a Polícia Civil do Rio
não respondeu à reportagem.
"Escritório
do Crime" pagava mesada, diz delator
Um dos delatores, o ex-PM
Orlando Oliveira de Araújo, o Orlando Curicica, apelido em referência ao bairro
onde ele chefiava uma milícia na zona oeste do Rio, afirmou em depoimento que
integrantes do "Escritório" pagavam uma mesada a alguns policiais da
DH para que investigações sobre as execuções praticadas pelo grupo paramilitar
não chegassem aos responsáveis pelos crimes.
Além de Curicica, um segundo delator - um homem que sobreviveu a uma
tocaia do grupo de matadores de aluguel - afirmou que há infiltrados entre os
agentes que atuam na delegacia especializada.
Relação
entre milicianos e políticos: "aliança satânica"
A suposta relação entre milicianos e políticos com o assassinato da
vereadora do PSOL e seu motorista chegou a ser comparada, em novembro passado,
pelo então ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, a uma "aliança
satânica". O ministro se referia às relações promíscuas envolvendo
policiais ligados a grupos paramilitares que praticam crimes (também chamados
de milícias), sobretudo assassinatos, a soldo de políticos e clãs da máfia da
contravenção carioca.
As investigações apontam
o "Escritório do Crime" como principal grupo paramilitar envolvido em
crimes de pistolagem (assassinato sob encomenda) no estado. Esta milícia é
formada por policiais e ex-policiais treinados em unidades de elite da polícia,
em especial o Bope (Batalhão de Operações Especiais) da Polícia Militar. Passou
pela unidade o sargento PM reformado Ronnie Lessa, apontado pela DH como quem
efetuou os disparos que vitimaram Marielle e Anderson.
Lessa é sniper (atirador de elite) e instrutor de armamento treinado
pela tropa de elite de onde também saiu o ex-capitão PM Adriano Magalhães da
Nóbrega, citado como chefe do "Escritório do Crime", milícia de Rio
da Pedras, na zona oeste do Rio, em investigações do Ministério Público
estadual. Ex-companheiros de farda, os dois "ex-caveiras" também têm
em comum um histórico de serviços prestados a dois dos principais clãs da máfia
da contravenção no Rio. Lessa nega ter participação no assassinato de Marielle
e Anderson.
Adriano foi expulso da PM
por trabalhar como segurança para membros da família de Waldomiro Paes Garcia,
o Maninho, assassinado em 2004. Ele está foragido. A ação de infiltrados
pode explicar a razão de Adriano ainda não ter sido capturado e outros
vazamentos de operações policiais no Rio. O próprio Lessa, após ser preso,
admitiu que recebeu informação de que estava sendo investigado.
Texto: DOL
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